Uma das visões mais partilhadas no Brasil em relação aos políticos é a de que são todos uns a cara esculpida e escarrada dos outros. Na linguagem do asfalto: farinha do mesmo saco. Em campanha, declaram-se capazes de tudo para melhorar a vida da coletividade. Eleitos, revelam-se todos incapazes. Ao menor sinal de escândalo, recorrem a um mesmo e invariável axioma: “Eu não sabia!”
Trata-se de uma desculpa multiuso. Serve para o Lula posar de inocente no mensalão do PT. Serve para o Azeredo se fingir de morto no mensalão do PSDB mineiro. Serve para Dilma reivindicar o papel de cega no petrolão. E passou a servir para que o Alckmin tente desembarcar do escândalo do cartel dos trens e do metrô de São Paulo.
Há dois dias, ganhou as manchetes a notícia de que a Justiça de São Paulo aceitou uma denúncia do Ministério Público sobre o cartel que operava sob as plumas do tucanato paulista. A encrenca envolve 11 empresas. São acusadas de se juntar num conluio para fraudar licitações e obter contratos da CPTM, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos.
A promotoria pede que sejam devolvidos aos cofres públicos R$ 481 milhões —a cifra, ainda sujeita a correção monetária, corresponde ao valor dos contratos e a uma indenização por danos morais. As fraudes citadas no processo ocorreram entre 2000 e 2007. Na maior parte desse período, o governador era Alckmin. Só deixou o cargo em 2006, para ser derrotado por Lula numa peleja presidencial.
Alckmin, você sabe, já declarou que “não sabia” da tramoia. Se houve cartel, costuma dizer o governador tucano, o Estado é “vítima”. E vai buscar o ressarcimento. Levando-se em conta tudo o que já havia sido noticiado em 2008, o lero-lero do governador perde substância.
Naquele ano de 2008, autoridades francesas e suíças invadiram os porões da Alstom, outra empresa do cartel. Recolheram sólidos indícios de pagamentos de propinas pelo mundo, algumas delas no Brasil – parte em São Paulo, parte na esfera federal. Em 2009, Alckmin ocupou o cargo de secretário de Desenvolvimento de São Paulo, no governo do correligionário José Serra. Em 2010, reelegeu-se governador. E nada de varejar os contratos.
Além de ser uma impossibilidade genética, a tese segundo a qual todos os políticos são iguais é uma armadilha perigosa. Na prática, desobriga o eleitor. Se são todos iguais, para que votar? Numa democracia ideal, a chave do sucesso está na capacidade de distinguir as diferenças.
A democracia brasileira talvez comece a ser construída no dia em que a plateia se der conta do seguinte: governantes que nunca sabem de nada são tolos cúmplices. Em qualquer hipótese, comprar um carro usado da mão deles ou dar-lhes o voto são coisas muito arriscadas.
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