segunda-feira, 13 de março de 2023

Com mochila cheia, centrão entra na gestão Lula pela fila 'nada a declarar'



No Brasil, o patrimonialismo tem a resistência de um diamante. Sobrevive a todos os governos. Pródigo na distribuição de cargos e verbas, Bolsonaro incluiu a Codevasf no rol de presentes dados ao cartel do orçamento secreto. Convertida em joia da coroa do centrão, a perversão na estatal foi contrabandeada na mochila do grupo para dentro da nova administração. Lula se finge de morto, enquanto verbas públicas são incorporadas a acervos privados.

Notícia publicada pela Folha revela que licitações malcheirosas feitas no apagar das luzes da gestão Bolsonaro são sacramentadas sob Lula como se os órgãos de controle não tivessem descoberto nada sobre as empresas vencedoras. Firmaram-se no alvorecer do novo governo pelo menos 47 contratos de pavimentação que, num mundo ético, seriam anulados. São dignos de inquérito, não de contratação. Negócios de R$ 650 milhões.

Dias atrás, o Globo já havia noticiado outra transação esquisita. A diferença é que foi 100% trançada sob Lula. Governador do Amapá até 31 de dezembro, Waldez Goes anunciara na véspera do fim do seu mandato a pavimentação de uma rodovia orçada em R$ 100 milhões. Sai de Macapá, em direção ao sul do estado. Obra a ser tocada em convênio com a Codevasf.

Em 1º de janeiro, Waldez foi nomeado por Lula para o Ministério da Integração Nacional, justamente a pasta que abriga a Codevasf. Como ministro, assinou a ordem de serviço para a obra que trombeteara como governador.

Chama-se Breno Chaves Pinto o dono da empresa que asfaltará a estrada do Amapá. Vem a ser suplente de Davi Alcolumbre, o senador que indicou Waldez a Lula. Preterido no ministério, Elmar Nascimento, um deputado da jazida de Arthur Lira, exigiu manter no comando da Codevasf o seu apadrinhado, o engenheiro Marcelo Moreira. Nomeado sob Bolsonaro em 2019, Moreira vai ficando. Com aval de Lula.

O terceiro retorno de Lula ao Planalto é marcado por uma peculiaridade. Quando alguém critica o governo, é chamado pelo petismo de fascista. Afinal, Lula prevaleceu na disputa contra Bolsonaro como um herói da resistência democrática, com apoio suprapartidário. Dá-se de ombros para o fato de que o brilho feérico dos diamantes do centrão começa a ofuscar as preciosidades da frente ampla.

Instado a comentar a encrenca da Codevasf, o Planalto preferiu o silêncio. Com mochila cheia, o centrão desliza suavemente para dentro do governo Lula pela fila "nada a declarar". Lula ainda não tem um bloco sólido de apoio no Congresso. Mas o centrão já catalogou o presidente da República no seu acervo particular.

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