quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Bolsonaro enxerga crime ambiental pela metade



Deve-se louvar o interesse de Jair Bolsonaro pelo mercado ilegal de madeira. Entretanto, ao mencionar num encontro dos Brics a intenção de divulgar nos próximos dias os nomes dos países destinatários de madeira extraída ilegalmente do Brasil, o presidente soou inadequado e parcial.

A inadequação se deve à escolha do palco. O tema não tem relação com a pauta do grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. A parcialidade decorre do fato de que o presidente mencionou apenas uma ponta do problema. Esqueceu de tratar da origem do crime.

Como qualquer outra cadeia criminosa que envolve roubo e receptação, o comércio ilegal de madeira é uma via de mão dupla. Há criminosos em toda parte: numa ponta, há os desmatadores. No meio, os intermediários. Na outra ponta, os compradores da madeira ilegal.

Mal comparando, o crime é semelhante ao jogo de futebol. O sujeito pode ser o maior craque do mundo, mas não marca gol sozinho. Há toda uma estrutura por trás, preparando o gol.

Há o clube, o médico, o massagista, o treinador e o time em campo, armando a jogada para que o gol aconteça. No crime ambiental é igualzinho. Sob Bolsonaro, surgiu um complicador.

Com a desestruturação de órgãos de controle como o Ibama, sumiram das margens do campo os fiscais. É como se o governo, ao se desorganizar, desejasse oferecer condições especialíssimas para que o jogo não sofresse interrupções. Armada a jogada, os criminosos apenas fazem o gol, cometem o crime.

O súbito interesse de Bolsonaro pela venda de madeira ilegal será mais louvável se o presidente incluir na divulgação que anuncia, além dos nomes dos países destinatários, a identidade dos criminosos que atuam no Brasil.

Em 2017, ainda no governo de Michel Temer, uma operação da Polícia Federal apreendeu 120 containers com 2.400 m³ de madeira ilegal que seria vendida para Alemanha, Bélgica, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Portugal e Reino Unido.

Portanto, a divulgação de nomes de países representará pouca coisa se não vier acompanhada de um rol de providências que Bolsonaro certamente adotará para punir os criminosos brasileiros.

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