Por Josias de Souza
Num instante em que algo como quatro dezenas de parlamentares respondem a inquérito no STF apenas no caso do petrolão, os deputados decidiram aprovar uma lei para desligar a TV Justiça da tomada. Querem impedir a transmissão das sessões plenárias da Suprema Corte nos julgamentos de processos penais e civis. A proposta já foi aprovada na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara. Seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça. Se for aprovada novamente, seguirá direto para o Senado.
O autor do projeto é Vicente Cândido (PT-SP), amigo dos petistas condenados no julgamento do mensalão, que popularizou, por assim dizer, a TV Justiça. O relator é Silas Câmara (PRB-AM). Sem meias-palavas, ele admite que quer apagar os refletores do plenário do Supremo para evitar os efeitos que as luzes provocam sobre as togas. Alega que as transmissões expõem “as entranhas da Justiça”, mostrando o que chamou de “sensacionalismo exacerbado” de alguns ministros. Para o relator, a superexposição ofende “a imagem, a honra e a dignidade da pessoa humana.”
Onde se lê “pessoa humana”, leia-se “réu”. Silas Câmara desqualifica em seu parecer os defensoeres da tese segundo a qual o interesse público se sobrepõe ao direito à privacidade que os réus poderiam, eventualmente, reivindicar: “Ocorre que esses militantes da mídia livre se esquecem que a garantia de um julgamento isento e imparcial é um direito humano, que se sobrepõe ao direito de informação, ou seja, o interesse público não pode ser maior do que o direito a um julgamento isento.”
Tomado pelos termos do relatório, os deputados parecem dar de barato que o calor dos holofotes derrete a isenção dos ministros do Supremo. Pior: avaliam que o processo de derretimento começa antes do julgamento:
“O cidadão vem sendo condenado a priori e de maneira covarde pela superexposição na mídia, exposição esta que influencia, também, diretamente no resultado do julgamento per se, ao criar o que podemos chamar, ironicamente, de ‘afã condenatório’ por parte de membros do Poder Judiciário que tenham dificuldade em conter eventuais ‘arroubos’ de vaidade, provocados pela súbita notoriedade conferida pela mídia”.
Ironicamente, a proposta anti-transparência vem à luz num instante em que os processos da Lava Jato são julgados na Segunda Turma do Supremo, sem a transmissão da TV Justiça. Apenas processos que envolvem os presidentes da Câmara e do Senado precisam ser obrigatoriamente submetidos ao plenário do tribunal.
Hoje, a exposição tem sido maior na jurisdição de Sergio Moro, em Curitiba. Ali, não há transmissões ao vivo. Mas o juiz da Lava Jato cultiva o hábito de filmar seus interrogatórios, divulgando-os na sequência. Disponíveis na internet, os vídeos revelam que os cofres do Estado vêm sendo assaltados com método pela quadrilha de oligarcas empresariais e políticos. Quem assiste percebe que o melhor detergente contra esse tipo de sujeira é mesmo a luz do Sol.
Nenhum comentário:
Postar um comentário