quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Lira usa pesquisas para tentar ser o capataz dos reaças; projeto fere Carta



Arthur Lira (PP-AL) conseguiu aprovar regime de urgência para votar o projeto de Ricardo Barros (PP-PR) que criminaliza as pesquisas eleitorais. Tudo é uma aberração: o projeto, Lira, Barros, estes tempos... O presidente da Câmara, vice-rei que manda mais do que o soberano, está tentando se manter na cadeira.

Se Jair Bolsonaro vencer, Lira sabe que o presidente reeleito dependeria menos dele do que hoje. O PL pode reivindicar o cargo, com seus 99 deputados. Com 47, o PP será apenas a quarta legenda, com 11 cadeiras a menos. Se Lula for o vitorioso, dificilmente a federação PT-PCdoB-PV, com 80 parlamentares (segunda bancada), emplacaria a Presidência da Câmara, mas há terreno para negociar um nome alternativo, ainda que no campo conservador. Liderar a cruzada contra os institutos é pauta que agrada aos 50 tons de reacionarismo que estarão representados na Câmara. Ambiciona o posto de capataz ao menos.

Não há consenso na Casa sobre as penas que seriam aplicadas aos institutos. O texto de Barros é uma burrice obscurantista e prevê de 4 a 10 anos de prisão a quem publicar, "nos 15 dias que antecedem às eleições, pesquisa eleitoral cujos números divergem, além da margem de erro declarada, em relação aos resultados apurados nas urnas". É de trincar catedrais.

Quando sérias, pesquisas não fazem previsões, mas captam a intenção de voto dos eleitores no momento em que são feitas, e o mesmo vale para a margem de erro e o intervalo de confiança. O espetacular é que Lira e Barros lideraram os esforços para mudar a Lei de Improbidade Administrativa, que passou a punir apenas o dolo, mas não o erro. E olhem que, em matéria de pesquisa, nem se cuida de falar em "erro", reitere-se.

Não é de hoje que os pterodáctilos estão de olho nos institutos. Vem de longe a proposta para proibir pesquisas nos 15 dias que antecedem as eleições, como se as empresas, bancos e partidos fossem deixar de encomendá-las. A medida apenas privaria a população de ter mais informação na hora de decidir.

Prestem atenção! Um erro cometido pelo responsável por um instituto — e não está claro também quem seria — poderia ter uma pena superior à aplicada por corrupção passiva, corrupção ativa ou peculato: de 2 a 12 anos nos três casos. Até um condenado por homicídio, a depender das circunstâncias (6 a 20 anos), poderia ter uma pena menor. O projeto é um delírio da delinquência legislativa, típica desses tempos.

Note-se que Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, não tem nenhuma simpatia pela proposta e já deixou claro que a Casa dificilmente apreciaria o texto neste ano ainda que aprovado pela Câmara.

O SELO DE AÉCIO
O deputado Aécio Neves (PSDB-MG) propõe como alternativa à punição um selo que seria concedido pelo TSE. A coisa funcionaria assim: cotejar-se-iam o resultado das urnas com as pesquisas feitas nos três dias anteriores à eleição. Quem acertasse na margem de erro levaria selo verde; se fora da margem de erro até o dobro dela, amarelo. Se acima do dobro, vermelho. O selo acompanharia o instituto.

Parece bom, mas não é. Por várias razões:
- continua a incorporar a ideia de que pesquisa faz previsão;
- um instituto poderia ficar sem selo nenhum; bastaria não fazer levantamento nos três dias antecedentes;
- um instituto poderia ganhar "selo verde" de um órgão oficial e delinquir à vontade, sob as bênçãos do TSE. Faltando alguns meses para a eleição, começaria a se corrigir...

INCONSTITUCIONAL
De resto, qualquer porcaria que se tente criar para criminalizar as pesquisas esbarra na Constituição. O Supremo ainda não é o puxadinho de Jair Bolsonaro e do Centrão. Eles estão querendo usar as eleições para pavimentar o caminho para a ditadura, mas ainda não chegaram lá.

As restrições que querem criar às pesquisas esbarram em dois artigos da Constituição, considerados cláusulas pétreas:
Inciso IX do Artigo 5º:
"É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;"
Artigo 220
A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

Bolsonaro, Lira e Barros adorariam fazer do Supremo um quintal para os folguedos de milicianos e capatazes do centrão. Mas ainda não alcançaram seu intento. Têm apenas 20%, lembram-se?

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