sábado, 4 de junho de 2022

Liberdade dos agentes da "câmara de gás" desrespeita a lógica e o morto



Dez dias depois do assassinato de Genivaldo de Jesus Santos na "câmara de gás" improvisada por agentes da Polícia Rodoviária Federal na traseira de um camburão em Sergipe, o Ministério Público Federal ainda não se convenceu da necessidade de pedir a prisão preventiva dos executores do crime. Eunice Dantas, a chefe do MPF no estado, alega que a medida é "excepcional" e que, momento, é preciso se concentrar na "produção de provas". A alegação é precária e desconexa.

A precariedade decorre do fato de que o artigo 312 do Código de Processo Penal inclui entre os motivos que justificam a excepcionalidade da prisão preventiva a "conveniência da instrução criminal", desde que haja "prova da existência do crime e indício suficiente de autoria." Ou seja: se os autores de crime incontroverso estiverem soltos e puderem de alguma forma atrapalhar a investigação —adulterando provas ou constrangendo testemunhas, por exemplo— a prisão preventiva deve ser requerida.

A desconexão do argumento da doutora que chefia o MPF em Sergipe fica evidente quando se considera que os três agentes da PRF acusados de matar Genivaldo estão livres para interferir na produção de provas. Continuam tendo acesso às testemunhas e, sobretudo, às dependências da Polícia Rodoviária Federal.

Na prática, a filmagem da ação policial é, neste caso, a mãe de todas as provas. Não resta a mais remota dúvida quanto à prática criminosa. Os agentes do estado pararam Genivaldo a pretexto de admoestá-lo por pilotar uma moto sem capacete. Em vez de aplicar a multa de R$ 293,47, preferiram insultar, revistar, derrubar, amarrar e enfiar Genivaldo na traseira de uma viatura, asfixiando-o com gás lacrimogêneo até a morte.

A manutenção dos assassinos em liberdade atenta contra lógica da instrução do processo, ameaça a segurança de testemunhas e ofende a memória do morto. Como se tudo isso fosse pouco, a inação prolonga a tortura, impondo sofrimento adicional aos familiares da vítima.

Por Josias de Souza

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