quinta-feira, 21 de outubro de 2021

Bolsonaro oficializa o "Auxílio Reeleitoral". E pobres precisam do dinheiro



Fato: capitulou o suposto último bastião do governo em defesa do teto de gastos. E, como se nota, Paulo Guedes já elaborou uma teoria para o caso. Ele é bom nisso. O que era inegociável no dia anterior pode ser descartado no dia seguinte e ainda com direito a voos teóricos, como a indicar que seus críticos nunca conseguem alcançá-lo. Ele estaria sempre alguns passos adiante.

Como sabem os leitores, sempre defendi, dadas as novas circunstâncias, que houvesse uma revisão no teto de gastos. Flerte meu com a irresponsabilidade? Ora, responsável era Guedes, né? Não se trata disso: é que, objetivamente, não há dinheiro para fazer frente a alguns desembolsos necessários, que se impõem.

"Ah, Reinaldo virou governista agora?" Acho que não. Continuo a achar que o presidente tem de ser condenado e ir para a cadeia. Ademais, decidiu lançar o maior programa de que se tem notícia de compra de votos. E olhem que ele não esconde o intento. Como se sabe, o Auxílio Brasil será mesmo de R$ 400 até dezembro de 2022. Na formula anunciada, o ainda Bolsa Família terá um reajuste já de 20% — a média passa de R$ 189 para R$ 226,8 —, e o que falta para chegar a R$ 400 sairá do IR sobre dividendos, se aprovado, e do calote nos precatórios — idem. Mas ainda fica faltando dinheiro: nesse ponto, diz Guedes, ou se antecipa a revisão do teto ou se pede uma licença para furar o dito-cujo.

Onde está o passa-moleque de Bolsonaro? Ele diz que os 20% de reajuste se incorporam ao ganho permanente do Bolsa Família. Ocorre que ninguém sabe de onde sairá o dinheiro. Digamos que consiga achar um jeito. Os R$ 173,20 que separam esse valor dos R$ 400 anunciados são uma grana temporária: será paga até dezembro de 2022, que é quando termina o mandato do presidente — caso não seja renovado.

E, claro!, Bolsonaro está, explicitamente, contando com dinheiro que ainda não tem e com o estouro do teto para tentar ganhar votos. A partir de 2023, só Deus sabe! É claro que o benefício, uma vez dado, não poderá ser retirado. E Guedes? Ficou chateado com o conjunto da obra? Ah, não! Ele já tem uma nova teoria: segundo diz, não há nada de populista na decisão do presidente, e os críticos não estariam percebendo a intenção: "Queremos ser um governo reformista e popular. E não um governo populista". Nada mal para quem prometeu um casamento entre liberais e conservadores para substituir 30 anos de social-democracia.

Já escrevi e reitero: a miséria e a fome voltaram com tal força no Brasil que a resistência a um reajuste do Bolsa Família e a um aumento do valor do benefício assume contornos, vamos dizer, de um administrativismo frio, que ignora os que estão catando alimentos no lixo. Por outro lado, por óbvio, Bolsonaro não está oferecendo uma saída. O que ele montou, com a parte temporária do benefício, é um programa de captação de votos. Mas, como costuma acontecer por algum tempo ao menos, os que estão em situação de extrema vulnerabilidade não terão por que reclamar do dinheiro a mais.

Não vamos fingir. A maioria de nós tem, no máximo, uma ligeira noção de como é a vida de pessoas para as quais R$ 100, R$ 150 ou R$ 200 podem ser a diferença entre a fome e alguma esperança ao menos. Governantes honestos, diante dessa evidência, buscam responder à situação emergencial, mas também se ocupam de soluções de longo prazo. Bolsonaro não consegue dizer nem como vai arcar com o reajuste de 20% do atual Bolsa Família, cujo pagamento médio, reitere-se, é de R$ 189. E, despudorado que é, não se intimida em anunciar que 43.3% do novo valor do programa só valem até dezembro de 2022. Outra parcela, o reajuste de 20% concedidos agora, ainda não tem garantida a fonte de recursos.

E Paulo Guedes, que havia mobilizado colunistas amigos para dizer que ele estava empenhadíssimo no teto, mas Bolsonaro nem tanto, tentando convencer, mais uma vez, os que caem na sua conversa de que é ele a garantia de um governo responsável? Bem, além de flertar com ideias em si mesmas contraditórias -- a) ou se antecipa a revisão do teto e ou b) se pede licença especial para furá-lo --, o doutor dá conta de que estaria em gestação alguma coisa grandiosa e permanente, não sem antes transferir responsabilidades. Afirmou:
"Estava expirando o Auxílio [emergencial]. O governo decidiu criar o que seria um programa de renda básica familiar. Ainda não é o que será. Temos protótipo do que seria a renda básica familiar. Não tem fonte para programa permanente. Então uma parte é transitória. Estávamos contando com a reforma do Imposto de Renda, mas não progrediu no Senado. Ficamos sem fonte".

Só para constar: ainda que se aprove a "reforma do Imposto de Renda", inexiste fonte para o "Auxílio Brasil" de R$ 400. Assim, há os fatos, e há aquilo que Guedes diz.

De todo modo, vocês viram, os tais mercados ameaçam um tanto, podem até morder, mas tudo tem limites. O rombo no teto, como antecipei aqui, foi precificado na terça. Bolsa despencou, e dólar disparou. Feito o estrago, sempre chega a hora de apostar em alguma recuperação, como se viu nesta quarta: a Bolsa subiu, e o dólar caiu. Ainda que tudo continue muito ruim,

Bolsonaro lançou o Plano Auxílio Reeleitoral.

Sim! Os pobres precisam desse dinheiro já, no presente! E o governo não lhes oferece nenhum futuro.

Por Reinaldo Azevedo

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