segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Nem Deus nem o diabo são candidatos (Editorial do Estadão)



É falsa a afirmação de que, nas eleições deste ano, o eleitor terá de decidir entre Lula e Bolsonaro. Trata-se de manipulação asfixiante e rigorosamente antidemocrática

Diante do descalabro do governo de Jair Bolsonaro, parece evidente a necessidade de que as eleições do segundo semestre sirvam para interromper o retrocesso e a destruição a que o País vem sendo submetido desde 2019 pelo bolsonarismo. Trata-se de imperativo civilizatório mínimo. Jair Bolsonaro mostrou-se indigno e incapaz do cargo que lhe foi atribuído em 2018.

Mas o desempenho sofrível de Bolsonaro na Presidência da República não leva apenas a rejeitar o bolsonarismo nas urnas. Isso seria pouco. A experiência com o governo atual explicita, com poderosa contundência, a necessidade de que a campanha eleitoral esteja centrada em ideias e propostas políticas, e não apenas em nomes. Essa é a melhor proteção contra a farsa bolsonarista.

Deve-se destacar, ao mesmo tempo, que esse tema transcende as circunstâncias políticas atuais, tendo raízes na própria essência do regime democrático. Não há pleno exercício dos direitos políticos se o eleitor faz na urna mera opção por nomes. Não há plena cidadania se o voto é tão somente uma avaliação sobre o passado. O direito ao voto inclui a possibilidade de escolha sobre o futuro do País. Daí a importância de haver – sempre, mas especialmente em ano eleitoral – uma genuína e ampla discussão a respeito dos diagnósticos e soluções possíveis para os problemas nacionais. Fugir desse debate é ludibriar, de partida, o eleitor.

Por óbvio, ninguém tem o descaramento de negar explicitamente a conveniência de discutir, numa eleição, o futuro do País. A manipulação é um pouco mais sutil, mas igualmente nefasta. Por exemplo, é cada vez mais comum ouvir que, nas eleições deste ano, o eleitor terá de decidir entre Lula e Bolsonaro. Essa afirmação, que pode soar a alguns ouvidos como realista – afinal, são os nomes que aparecem nas primeiras posições das atuais pesquisas de intenção de voto –, é inteiramente equivocada. Vigora no Brasil o sistema do pluripartidarismo e se pode afirmar, com toda a certeza, que haverá outros candidatos disputando a Presidência da República em outubro deste ano. Além disso, o primeiro turno das eleições ainda está muito distante.

A falsa disjuntiva entre Lula e Bolsonaro tem um só objetivo: desqualificar e impedir o debate de propostas e ideias políticas sobre o futuro do País. Trata-se de manipulação asfixiante e rigorosamente antidemocrática.

Como esperado, o PT se empenha em fazer com que o eleitor acredite que inexistem alternativas a Lula quando se trata de escolher um candidato capaz de desbancar Bolsonaro. O partido quer encerrar o eleitor desde já numa estreita clausura eleitoral: ou Lula ou Bolsonaro. Ao fazê-lo, o PT se dispensa de apresentar uma discussão madura sobre o futuro do País. Quer impor um binarismo que, a rigor, nem é escolha: é imposição do retrocesso, seja qual for o resultado.

Não é nova a tentativa do PT de desqualificar toda opção política não alinhada ao lulopetismo. Agora, no entanto, a pretensão autoritária tem ganhado contornos escandalosamente explícitos. Em recente reunião da legenda, segundo informou o UOL, Lula disse com todas as letras como se vê – e como deseja colocar o eleitor entre a cruz e a espada. “A humanidade acompanha há séculos a polarização entre Deus e o diabo, e nunca teve terceira via”, disse. Nesses termos apocalípticos, supõe-se que todo aquele que não votar em Lula estará escolhendo o diabo.

Outra tentativa de impedir que o eleitor pondere serenamente a respeito das consequências do seu voto sobre o futuro do País é afirmar que as eleições presidenciais de 2022 são apenas e tão somente um plebiscito sobre a barbárie do governo Bolsonaro. Sob essa lógica, para impedir um segundo mandato de Bolsonaro, valeria a pena votar em qualquer outro candidato. É bom lembrar que foi esse estreito raciocínio, antes aplicado ao lulopetismo, que conduziu Bolsonaro ao Palácio do Planalto. Não convém repetir o erro.

Eleições não são mero duelo de nomes. O voto é oportunidade de avaliar o passado e, de forma muito especial, de definir o futuro.

Um comentário:

AHT disse...

DO HILÁRIO AO SÉRIO DA TRÁGICA REALIDADE

Diante das absurdas crises causadas lá nos Poderes
Onde tudo é negociável e, ao povo, só “top top”,

Haja consolo à nação desalentada, haja
Inspiração em formular pensamentos positivos após
Lamentos e indignações, a sós ou coletivamente.
Álibis estão sempre disponíveis aos corruptos, sempre
Respaldados por leis e suas brechas personalizadas,
Invertendo o que seja Legislar e assegurar a Justiça.
O remédio para as vítimas? “Rir é o melhor remédio”.

A desfaçatez é tanta, que até o mandatário eleito e
Os seus oportunistas seguidores caçoam de vítimas.

Sanguessugas e violentadores da nação, seguros em
Édens sustentados pela corrupção, todos sem o menor
Rubor em suas cínicas caras de safados de nascença.
Invariavelmente, antes das eleições essas caras de
Oportunistas safados se transformam em sérias e,

Demagogos por excelência desde que nasceram,
A manipulação da opinião pública garante reeleições.

Trabalhadores punidos pelo desemprego decretado,
Rendas e salários corroídos pela inflação evitável.
Ávidos pelo Poder e Riqueza agindo nos protegidos
Gabinetes e plenários garantindo o “seu” - e, o resto?
Impublicável expressão seria escrita aqui, nessa linha.
Covid-19 aconteceu, o lado pior do governo falou alto.
A tragédia anunciada, milhares pagaram com a vida.

Rio Tapajós, sua bacia sendo detonada pelo garimpo
E, consequentemente, danos ambientais irreparáveis,
A saúde da população ribeirinha afetada pelo mercúrio.
Levas, hordas de desmatadores impunes e, absurdo,
Incentivados por dúbias medidas do governo!
Das armas e munições liberadas sob justificativas
As mais estapafúrdias, facilitando ações e impunidade
Do tráfico e milicias. A quem interessa isso tudo?
Esse país tem jeito? Que país é esse? É o nosso Brasil.


AHT
21/02/2022