terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

'Canalha' e 'trotskista' visitam o 'desqualificado'



Chamados desrespeitosamente de "canalha" e "trotskista" por Bolsonaro, os ministros Alexandre de Moraes e Edson Fachin visitam um presidente que ambos classificam em privado de "desqualificado" e "golpista". O pretexto é institucional. Fachin, o "trotiskista", assumirá a presidência do TSE em 28 de fevereiro. Moraes, o "canalha", será o seu vice. A dupla vai ao Planalto para convidar Bolsonaro, o "desqualificado golpista", para a solenidade de posse. Esse encontro é surpreendente, desmoralizante e preocupante.

A conversa surpreende porque magistrados que dialogam amistosamente com quem se esmera em ofendê-los confundem institucionalidade com avacalhação. O convite ao presidente poderia ser levado por um assessor do TSE. Ou pelo Correio. A audiência desmoraliza porque ocorre apenas dez dias depois de Bolsonaro ter descumprido ordem judicial de Moraes para depor à Polícia Federal.

A coisa preocupa porque o local mais adequado para que magistrados do STF e do TSE conversem com um presidente multiprocessado seria não o gabinete presidencial, mas o corpo dos processos. Nos autos, Bolsonaro se manifesta por meio das petições dos seus advogados, lotados na Advocacia-Geral da União. Seus julgadores se expressam por intermédio de despachos, intimações e sentenças.

No último mês de outubro, faltando um ano para a eleição presidencial de 2022, o TSE realizou um julgamento sintomático. Em decisão unânime, a Corte arquivou o pedido de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão.

Num voto cirúrgico, o ministro Luiz Felipe Salomão, então corregedor da Justiça Eleitoral, mapeou os disparos tóxicos realizados pela milícia digital bolsonarista na campanha de 2018. Mas Salomão e outros seis ministros —entre eles Moraes e Fachin— concluíram que não havia elementos suficientes para justificar a descida da lâmina sobre a chapa vencedora.

Durante o julgamento, Alexandre de Moraes, que assumirá o comando do TSE em agosto, soou ameaçador. Declarou que, se repetirem as estripulias em 2022, os milicianos digitais "irão para a cadeia".

Quem observa os salamaleques que o "canalha" dedica ao "golpista" cada vez que recebe um telefonema apaziguador do seu patrono Michel Temer se pergunta: "Será?"

No Supremo, Alexandre de Moraes é relator de inquéritos em que Bolsonaro, seus filhos e seus aliados figuram na condição de investigados. Já mandou para a cadeia trovões, jeffersons e outros fanfarrões. Mas a valentia do ministro ainda não se apresentou para Bolsonaro senão na forma de uma flagrante impunidade.

- Atualização feita às 14h10 desta segunda-feira (07): Durou algo como dez minutos o encontro entre os futuros dirigentes do TSE e o presidente da República. Mais uma evidência de que o país e os próprios ministros teriam sido poupados do constrangimento se a entrega do convite para a posse tivesse sido terceirizado a um carteiro.

Por Josias de Souza

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