quinta-feira, 6 de abril de 2023

Ao se defender, Bolsonaro revela-se indefensável



A advocacia é um desses casos raros em que a mentira se torna virtude. No ramo criminal, grandes advogados são pós-graduados em jurisprudência. Advogados geniais são mestres na arte de mentir. No escândalo das joias, a inverdade é manuseada com tanta sinceridade que se torna contraproducente. No esforço para ajustar as versões de Bolsonaro aos achados da Polícia Federal, a defesa revela que o investigado tornou-se indefensável.

Na penúltima explicação, apresentada num depoimento constrangedor de três horas, Bolsonaro alegou ter mobilizado a República para reaver as joias de R$ 16,5 milhões apreendidas na alfândega para evitar um vexame diplomático, já que o pacote era um presente da Arábia Saudita. No alvorecer do escândalo, ele se dizia injustiçado, pois não havia pedido nem recebido nenhum presente. Depois, admitiu que as joias seriam para Michelle Bolsonaro. Agora, reconhece que quis apalpar os diamantes.

Orientado pelos advogados, Bolsonaro disse que não tentou liberar as joias "na mão grande", mas por meio de ofícios. Isso revelaria transparência e boa-fé. Faltou exibir o único ofício aceitável segundo a orientação dos fiscais da alfândega. Nele, estaria escrito, sem espertezas ou meias palavras, que o bem pertence ao Estado. Outros dois estojos com joias sauditas saltaram de documentos formais para o acervo privado de Bolsonaro. Não fossem a imprensa e o TCU, os objetos ainda estariam escondidos num cofre do amigo Nelson Piquet. Isso revela desonestidade e má-fé.

O bêbado e Bolsonaro são personagens oblíquos. Ambos trilham caminhos tortuosos, enviesados. Um, por excesso de bebida. Outro, por escassez de retidão. A sinuosidade do embriagado costuma terminar no chão. Espera-se que Bolsonaro, inebriado com a própria ficção e com o zigue-zague dos advogados, se esborrache numa sentença condenatória.

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