quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Senado acerta: enterra lei autoritária. Será preciso derrubar vetos do ogro



Como sempre afirmei aqui e em toda parte, havia o que prestava e o que não prestava na Lei de Segurança Nacional (7.170). A punição a ações violentas -- ou tentativas de -- contra os Poderes constituídos, por exemplo, estava entre as sanções necessárias. Já a persecução penal a quem simplesmente emitisse um juízo crítico contra chefes de Poderes era uma aberração, como o Artigo 26 da 7.170, que lembro a título de exemplo:

"Art. 26 - Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação.
Pena: reclusão, de 1 a 4 anos."

Como assim? Então deve ser permitido caluniar essas autoridades? Ora, a punição para os que cometem crimes contra a honra de terceiros já está prevista no Código Penal.

Ocorre que, se o bom uso da lei servia para levar aos tribunais um Daniel Silveira por suas óbvias agressões às instituições, o seu mau uso fez com que o governo Bolsonaro perseguisse jornalistas e cidadãos comuns por simplesmente emitirem um juízo crítico ao presidente da República.

De toda sorte, havia o crivo da Justiça. E, mais de uma vez, eu me opus à proposta de simplesmente extinguir a Lei de Segurança Nacional, não pondo nada em seu lugar. Se era um pleito histórico das esquerdas, passou a ser uma pauta da extrema direita, que reivindicava — e reivindica — seu suposto direito de ir às ruas pregar o fechamento do Congresso e do Supremo. Assim, era preferível, num momento de incitações golpistas, a existência da Lei 7.170 a lei nenhuma.

Mas o Congresso fez a coisa certa já na Câmara dos Deputados e seguiu acertando no Senado. Junto com a extinção da Lei de Segurança Nacional veio a aprovação da Lei de Defesa do Estado Democrático. Agora, sim, as coisas estão no devido lugar. E, por isso mesmo, parece inescapável: Bolsonaro vai vetar trechos do texto. E cumprirá ao Congresso, por maioria absoluta — mínimo de 257 votos na Câmara e de 41 no Senado — derrubar os eventuais vetos.

No dia 4 de maio, a Câmara aprovou um bom substitutivo da deputada Margarete Coelho (PP-PI), que incorpora ao Código Penal os crimes contra a segurança do Estado democrático, mandando para o lixo as aberrações da Lei da Segurança Nacional. Não se caiu na armadilha que havia sido preparada pela extrema direita: o vazio legal.

MEDIDAS
Pune-se, por exemplo, com pena de 1 a 4 anos de reclusão -- podendo ser de 2 a 8 em caso de lesão grave ou de 4 a 12 em caso de morte -- aqueles que recorrerem à violência ou grave ameaça para impedir o exercício pacífico e livre de manifestação de partidos políticos, movimentos sociais, sindicatos, órgãos de classe ou demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos.

A Lei de Segurança Nacional traz, por exemplo, no Artigo 23, a punição a quem incita a animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e a sociedade — ainda que lá se fale em "classes sociais". Isso não poderia desaparecer, como queriam os golpistas de hoje. A nova lei, aprovada agora nas duas Casas, pune com 3 a 6 meses ou multa quem incorrer em tal crime. Acho a pena branda demais. Mas está no texto.

ELEIÇÕES E FAKE NEWS
O novo texto pune com prisão de 3 a 6 anos e multa quem impedir ou perturbar a eleição ou o processo de apuração com a violação de mecanismos de segurança do sistema eletrônico de votação.

Certo como dois e dois são quatro, Bolsonaro vai tentar vetar o dispositivo da lei que pode mandar para a cadeia propagadores de fake news nas eleições. A comunicação enganosa com fins eleitorais pode render pena de 1 a 5 anos. Recorrer à violência ou intimidação para limitar o exercício da cidadania: punição de 3 a 6 anos.

E quem se organizar para, mediante violência ou grave ameaça, tentar derrubar o estado democrático e de direito? De 4 a 8 anos de cana. Expõe-se à reclusão de 4 a 12 quem decidir depor, nessas condições, um governo legitimamente eleito.

Há ainda outras punições — corretas e sensatas — que estavam na antiga Lei de Segurança Nacional, que contava, no entanto, com um lixão que deveria ser banido. Adivinhem: era justamente a esse lixão que recorria o governo Bolsonaro para intimidar opositores.

No dia em que o presidente promoveu o seu patético desfile golpista, o Senado deu uma resposta correta: enterra a Lei de Segurança Nacional e põe no lugar um texto em defesa da democracia. Agora é preciso se organizar para derrubar os vetos do ogro a que alguns chamam "Mito".

Afinal, ele não se conforma que pessoas que se organizam contra o estado democrático e de direito possam ser punidas. Sem isso, parte de sua militância não existe.

Por Reinaldo Azevedo

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